Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]



Em que isto é um pouco complexo mas...
prontos...

 

Depois desta nossa tortuosa caminhada pelo obscuro átrio da resposta à pergunta "O que é o Iluminismo ?" urge um balanço. Sobretudo porque não queremos (ser) mal entendidos.

 

A sistematização só nos tomará três tempos...

 

Este é o primeiro (olhem que podia não ser!): começaremos pelo próprio texto, e só no final o contextualizaremos.

 

Como fizemos questão de realçar nos artigos iniciais desta série, parece-nos que a intenção do autor na primeira parte do texto é essencialmente provocatória.

 

Longe de apresentar uma lacónica introdução ao tema cuja definição está em causa (o Iluminismo), o autor decide montar uma intimidação do leitor e para depois lhe apresentar a via para um desenlace feliz.

 

 

Notemos assim de chofre que, curiosamente, a resposta à pergunta que nos ocupa começa pelo fim (ou seja, por uma "conclusão"), esgotando-se directamente logo na primeira linha do texto — não com uma definição canónica (género próximo e diferença específica ou, no mínimo, enumeração de características essenciais), mas através da apresentação de um desígnio (ou seja, de uma causa final — "O lluminismo é a saída do homem da sua menoridade").

 

A despeito de todas as leituras possíveis, esconde-se aqui uma implicação implícita relativamente à qual nunca será demais insistir:

 

muito mais do que um corpo doutrinal determinado,
o Iluminismo é um processo

 

 

Sendo assim, como bem parece estar consciente o autor:

 

em lugar de se esgotar numa definição,
o Iluminismo actualiza-se num lema

 

 

"Sapere aude !"

 

 

O carácter mutável e mutante do Iluminismo e da Modernidade já foi por nós abordado várias vezes. A ele regressaremos também com regularidade.

 

Agora basta sublinhar como esta plasticidade incircunscriptível cuja direcção apenas se pode apontar por referência a um desígnio, a um movimento, implica em termos de inteligibilidade a sua explicitação pelo que lhe é exterior — em particular, aquilo que lhe é antagónico.

 

Em termos mais acessíveis: uma vez que não se pode, ou não se quer, definir o Iluminismo positivamente, ou seja, canonicamente, restaria ao autor, para ultrapassar o estádio de semi-obscuridade conceptual em que nos mantém, definir aquele contexto em que ele surge, definir aquele estádio final para que aponta ou, ainda mais especificamente, definir aquela entidade ou situação que lhe é antagónica.

 

É esta a "terceira via" que escolhe o autor, contrapondo ao dinamismo indefinível do seu ente a definição do seu antagonismo (a menoridade é: "incapacidade de entendimento" & "orientação de outrem").

 

Se perante o telegrafismo nos serve ainda alguma lucidez, temos já aqui em anúncio aquilo que virá a ser a dialéctica hegeliana...

 

Mas para já, chega de espreitar para baixo do véu. Procuremos antes emergir até um nível mais superficial...

 

 

Naquilo que toca o mais impressionável leitor mundano, aquilo que se fez foi muito mais elementar: apontou-se-lhe um antagonista.

 

Ou melhor: uma vez que o leitor mundano perante apenas duas linhas de texto se encontra fora de contexto, aquilo para que se lhe apontou foi um espectro — lá está... um fantasma de difuso contorno... em suma, um temor...

 

Repare-se bem que com esta operação aquilo que revela o nosso autor é a sua maestria perante a orquestra do mundo: no interior das mentes impressionáveis obteve psicologicamente o efeito de desencadear aquela torrente que depois apenas resta canalizar:

 

perante o temor abate-se o dilema...

 

SHOULD  I  STAY  OR  SHOULD  I  GO

 

— Elementar, meu caro Watson.

 

 The Clash — "Should I Stay or Should I Go"
(in Combat Rock, 1982)

 

 

(continuará...)

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 12:03

34. O que é o Iluminismo ? (9)

por PM, em 26.09.16

Em que o Iluminado conclui o farpejar dos inconformados e
nós nos familiarizamos com o funcionamento
das geringonças

 

À medida que vão emergindo as complexas figuras (fantasmas) que percorrem especularmente (ou seja, como num espelho) os estratos arqueo-lógicos do texto e nos vamos apercebendo da respectiva dimensão técnica e do engenhoso mecanismo de manipulação a que correspondem, começa igualmente a adquirir um contorno mais preciso a acusação que devolvemos ao nosso Acusador Transcendental — a de não passar de um manhoso vilão.

 

•••

 

Na parte final do segundo parágrafo (da versão portuguesa), procede o autor aos últimos ajustes do seu revolucionário acelerador do progresso histórico.

 

Porém, para o apreciarmos na sua justa dimensão, teremos de fazer marcha-atrás e percorrer com um pouco mais de atenção o 7.º extracto, que julgávamos ultrapassado...

 

 

7a. "Porque a imensa maioria dos homens (inclusive todo o belo sexo) considera a passagem à maioridade difícil e também muito perigosa é que os tutores de bom grado tomaram a seu cargo a superintendência deles."

7b. "Depois de terem, primeiro, embrutecido os seus animais domésticos e evitado cuidadosamente que estas criaturas pacíficas ousassem dar um passo para fora da carroça em que as encerraram, mostram-lhes em seguida o perigo que as ameaça, se tentarem andar sozinhas."

7c. "Ora, este perigo não é assim tão grande, pois acabariam por aprender muito bem a andar."

7d. "Só que um tal exemplo intimida e, em geral, gera pavor perante todas as tentativas ulteriores."

 

•••

 

— Assim decomposto em períodos, torna-se mais fácil abstrair do "sentido geral" (que já apontámos no artigo anterior) e pôr em evidência as metáforas a que recorre.

 

— No período 7a. procede o autor a "uma espécie de precisão" dos dois termos centrais que vinha a usar: "homens" e "tutores".

 

— "Homens" — afinal, trata-se de um conjunto composto por "a imensa maioria dos homens" (ou seja, digamos, "quase todos os homens") + "todo o belo sexo" (isto é, "todas as mulheres"); para lá da nota misógina com que pisca o olho ao leitor informado, temos aqui exposta, grosso modo, a contemporânea ideia de massa.

 

"Tutores" — são os superintendentes (aqueles a quem cabe a "superintendência") do conjunto anterior. Como já sabemos que quando interpretamos os Iluminados temos de estar muito atentos às implicações implícitas, ficamos cientes de que estes "intendentes" estão acima ("super-") da massa entregue à respectiva "super-visão".

 

— Contudo, esta aparente preocupação denotativa é desmentida logo a seguir...

 

— No período 7b. somos informados que 1) a imensa maioria dos homens (a massa) foram inicialmente embrutecidos pelos tutores até à condição de 2) animais domésticos e que, 3) convertidos assim em criaturas pacíficas, foram 4) encerrados numa carroça (tenha-se bem presente como estes "animais pacíficos" em vez de seguirem pelo seu próprio pé são conduzidos num veículo primitivo para um destino ignorado — não seria estranho que se tratasse de algum matadouro...) no interior da qual são 5) aterrorizados de modo a temerem a evasão.

 

— Para lá de qualquer sentido mais ou menos óbvio que lhe queira dar o leitor, sobressai agora a associação da metáfora da menoridade infantil à metáfora do rebanho de pacíficos animais domésticos... maltratados por impiedosos pastores... Acreditamos não ser preciso desenvolver muito mais...

 

— Em 7c. insiste na ideia de que a criança (talvez em estado de "natureza", situação em que se encontram os animais não-domesticados) bem poderia aprender a andar (sozinha?).

 

— E em 7d. volta a brandir o carácter intimidatório da acção dos "tutores" e o "terror" que subjuga a "imensa maioria dos homens"...

 

Como vemos, é notável neste texto a preocupação imagética do nosso analítico filósofo ... Se apresentasse igual preocupação argumentativa, muito trabalho nos poderia poupar !

 

•••

 

Conscientes agora do cenário em que subtilmente fomos colocados, podemos progredir com maior segurança.

 

8. "É, pois, difícil a cada homem desprender-se da menoridade que para ele se tomou [483] quase uma natureza. Até lhe ganhou amor e é por agora realmente incapaz de se servir do seu próprio entendimento, porque nunca se lhe permitiu fazer semelhante tentativa."

 

— Este 8.º extracto, aparentemente uma conclusão bastante inócua do anterior, reforça a ideia da violência a que se encontra submetida "a imensa maioria dos homens", sublinhando-lhe o carácter arbitrário: em lugar da sujeição derivar da punição de alguma falta ou genuína deficiência, resultaria (supostamente) de uma vontade ancestral de lhe negar a autonomia do entendimento (note-se que o sujeito desta impiedosa acção continua envolto no maior mistério).

 

— Ora, esta situação de (suposta) servidão arbitrária, esta situação de (suposta, convém não esquecer nunca...) flagrante injustiça permite invocar, pelo menos perante o senso comum, uma espécie de "automática" legitimação do sentimento de revolta...

 

— Emerge perante nós, portanto, algo que ainda estava em falta — a saber, um dispositivo de legitimação da acção. Neste caso trata-se de uma velharia da cibernética analógica: a...

 

vitimização dos agentes

 

Consiste esta na legitimação da revolta e, em consequência,
da Revolução, através da proclamação de uma remota "via dolorosa"
a "vingar" pelos "oprimidos". Este tipo de legitimação tanto pode ser geral
(como no caso que presentemente nos ocupa, em que se refere à humanidade
quase inteira) como particular (quando se refere a um grupo minoritário explorado,
marginalizado, vilipendiado ou criminalizado, como irá acontecer com Marx e o seu
"martirizado" proletariado) ou até singular (vejam-se na actualidade as doutrinas de
"psicologização" do crime, em que este é interpretado como consequência "natural
e necessária das circunstâncias adversas que ao longo da vida teriam enfrentado
os infractores"). Trata-se de um dispositivo elementar de justiça retributiva
o famoso "olho por olho, dente por dente", geralmente associado à calúnia
e à demonização do adversário, interpretado como uma força inerte,
insensível e apologista de um determinado status quo.

 

•••

 

E para terminar este artigo...

 

9. "Preceitos e fórmulas, instrumentos mecânicos do uso racional, ou antes, do mau uso dos seus dons naturais são os grilhões de uma menoridade perpétua. Mesmo quem deles se soltasse só daria um salto inseguro sobre o mais pequeno fosso, porque não está habituado ao movimento livre. São, pois, muito poucos apenas os que conseguiram mediante a transformação do seu espírito arrancar-se à menoridade e encetar então um andamento seguro."

 

— Segue-se a consequência lógica da proposição anterior — se "a imensa maioria dos homens" está privada do uso do seu próprio entendimento, está, então, forçada a submeter-se ao entendimento alheio. Ou seja — à norma alheia.

 

— Se esta norma alheia (os "preceitos e fórmulas") não só é fruto da mera arbitrariedade como é ela própria instrumento mecânico (note-se como, curiosamente, o nosso autor recorre a esta designação associando-a a uma conotação negativa...) de sujeição, segue-se que só se pode tratar de uma norma perversa (ou seja, reproduzindo a cada geração os ditos "grilhões da menoridade perpétua")...

 

— Correlativamente, temos nós também o corolário cibernético do dispositivo de legitimação atrás apontado: o...

 

aviltamento da norma vigente

 

Este dispositivo subjaz à já referida demonização
do adversário
e equivale simplesmente ao desígnio de
promoção da Nova Ordem através da censura da norma
anterior
(como ainda havemos de ver, todos os dispositivos
aqui ainda convocados sub specie arcaica acabaram por ser
integrados nas "sociedades revolucionárias" dos nossos
dias com contornos muito mais sofisticados).

 

— Prestes a chegar ao fim, lembra-nos o autor que "mesmo quem deles [os grilhões] se soltasse só daria um salto inseguro..." recorrendo à banal reciclagem da chamada Alegoria da Caverna de origem platónica, mas rematando o bolo com uma deliciosa cereja:

 

"São, pois, muito poucos apenas os que
conseguiram (...) arrancar-se à menoridade"

 

... há mesmo uma mão-cheia de Iluminados, afinal !!!

 

•••

 

Engenharia da geringonça

Fardier à vapeur de Nicolas Joseph Cugnot.gif

Enquanto o nosso engenhoso prussiano se entretinha ainda com os planos transcendentais
da sua maquineta infernal, já os colegas gauleses experimentavam caranguejolas em estado de marcha.
(Na imagem encontra-se representada a carreta a vapor de Nicolas-Joseph Cugnot, de cerca de 1770.
Como é habitual, onde surge a machina surge o desastre — aliás, podemos ver à esquerda
o seu Iluminado inventor, procurando, sem dúvida, minimizar os estragos...)

 

•••

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 00:39

33. O que é o Iluminismo ? (8)

por PM, em 21.09.16

Em que, ignorando os prognósticos de
dilúvio, começamos a aproximar-nos
da velocidade
de cruzeiro

 

Tem sido lento o arranque... mas há que reconhecer que é trabalhosa a desmontagem das sugestões vagas tão ao gosto destes nossos luminosos pirilampos que, com os seus rodopios, teimam em nos desnortear — perdão: desorientar ! — na noite do espírito em que nos encontramos sepultados...

 

Vamos lá ver se agora se torna mais fácil:

 

7. "Porque a imensa maioria dos homens (inclusive todo o belo sexo) considera a passagem à maioridade difícil e também muito perigosa é que os tutores de bom grado tomaram a seu cargo a superintendência deles. Depois de terem, primeiro, embrutecido os seus animais domésticos e evitado cuidadosamente que estas criaturas pacíficas ousassem dar um passo para fora da carroça em que as encerraram, mostram-lhes em seguida o perigo que as ameaça, se tentarem andar sozinhas. Ora, este perigo não é assim tão grande, pois acabariam por aprender muito bem a andar. Só que um tal exemplo intimida e, em geral, gera pavor perante todas as tentativas ulteriores."

 

— Ena ! E ultrapassámos a primeira página !

 

— ... para continuarmos a ver o Idealista Transcendental urdindo a sua teia:

 

 

1) Depois de nos ter apontado a via para a redenção da culpa negligente que os homens carregam por cobardia (ou seja, a via da ideologia Iluminista, com o seu culto da Razão, aqui encarnada no "agrilhoado entendimento");


2) depois de nos sugerir como horizonte aquele estádio ideal de adultos emancipados (aqueles "sábios ousados e corajosos" da invectiva latina — "Sapere aude !" — em que se desenha já a escatologia do voluntarismo viril que tanto êxito fará depois de Nietzsche) e

 

3) depois de nos agitar à frente do nariz o fantasma de um ganancioso opressor (na altura, sobressaía entre os Germânicos o das religiões cristãs, em especial o Catolicismo Romano, tal como já no tempo de Lutero; porém, para o Iluminado, qualquer poder, qualquer hierarquia, qualquer ordem, qualquer tutor serve como antagonista: o objectivo prioritário é o da permanente dissolução de todos os laços de coesão entre os homens — claro, para além dos que ele mesmo autoriza),

 

4) encontra-se montado o seu dispositivo elementar de cibernética analógica:

 

ideologia + escatologia + antagonismo = machina revolucionária

 

Usamos o termo "machina" para sublinhar que 1) se trata de um
dispositivo relativamente "automático", que 2) não há diferenças significativas
nos princípios de acção/reacção de dispositivos "materiais" e dispositivos "conceptuais" e
3) preservamos a grafia arcaica exactamente para realçar a precedência destes
dispositivos "conceptuais" relativamente aos "materiais".

 

5) Seguidamente, trata-se apenas de a abastecer de "combustível" a geringonça...  Se observarmos com atenção o acima reproduzido 7.º extracto do texto, veremos como não passa de um modesto desenvolvimento do 5.º extracto — para lá da catadupa de lugares-comuns, aquilo que sobressai do nosso espalha-brasas é aquele aguilhoar das susceptibilidades dos leitores mais irritáveis, como acabámos de mostrar no artigo anterior.

 

6) Podemos então concluir que, para lá de todo o artefacto supostamente discursivo que (em vão!) nos entretivemos a desmontar, subjazia outro dos mais elementares dispositivos daquela cibernética analógica que se nos vai tornando cada vez mais familiar:

 

frustração + estimulação = revolta

 

Quando à machina revolucionária acrescentamos o combustível da
revolta, obtemos a revolução. A eficácia deste mecanismo pode medir-se em
rpm; vemos, portanto, como nestes tempos primitivos da cibernética analógica
os resultados obtidos eram francamente insatisfatórios, com relações
muito inferiores a 1 / 525600. Hoje está tudo muito mais
avançado, como teremos oportunidade de ver.

 

7) Ora, é então esta poderosa machina de psicologia política que o nosso autor trata aqui de pôr em funcionamento. Tendo começado por, de forma genérica, acossar os contestatários frustrados pelo dogma, os empreendedores frustrados pelos tutores e os voluntaristas frustrados pela norma alheia, passa agora a introduzir à estimulação curiosas nuances... Acrescenta-lhe aquele toque de machismo viril tão próprio de todos os... "ousados"... e aquela aversão ao rebanho tão característica dos... "originais"...

 

 

Com toda esta estimulação das poderosas forças instintivas que latejam bem no fundo de cada ser humano — em especial daquele mais... inconformado... — vemos agora com toda a clareza e distinção como, no percurso que aqui temos vindo a seguir, o nosso Iluminado (de outra forma sempre tão frígido e intelectual) parece ter vindo a encarnar, afinal, o curioso papel de...

 

agent provocateur...

 

•••

 

Não sei porquê, parece-me que
ainda
não tinha visto isto
em lado nenhum...

 

Dejà Vu.jpg

Agent Provocateur...
ou a estranha sensação de
que há sempre algo de novo
debaixo do véu...

 

 

Toda reprodução nos nossos artigos de matérias que são propriedade de
entidades terceiras se encontra enquadrada pelo disposto no Código dos direitos
de autor e direitos conexos aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, e alterado
pelas Leis n.ºs 45/85, de 17 de Setembro, e 114/91, de 3 de Setembro, e Decretos-Leis n.ºs 332/97
e 334/97, ambos de 27 de Novembro, pela Lei n.º 50/2004, de 24 de Agosto, pela Lei n.º 24/2006 de
30 de Junho e pela Lei n.º 16/2008, de 1 de Abril, em especial no que estipula a alínea g) do artigo 75.º
(Capítulo II, Da utilização livre). Com regularidade, não mencionamos a origem dos materiais reproduzidos
para não indexar, ainda que de forma indirecta, os respectivos proprietários ou autores a nenhuma das
nossas posições religiosas, filosóficas, políticas ou outras, e causando-lhes, em virtude do carácter
objectivamente polémico dos nossos juízos, algum inconveniente ou dissabor. Caso os
legítimos proprietários pretendam que se introduza ou retire a menção explícita
do respectivo direito de propriedade, agradecemos o contacto directo.

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 13:27

32. O que é o Iluminismo ? (7)

por PM, em 17.09.16

Em que o Iluminista é um
Darwinista (social)
(antediluviano)
(etc.)

 

Acabámos de sugerir nós aquela académica incumbência de descortinar sentidos às crípticas insinuações do Mestre Idealista cujo opúsculo tão esmerada atenção nos tem merecido.

 

Na verdade, se na sugestão desse esquizofrénico exercício alguma lucidez nos assistiu, seria a consciência de que tem sido exclusivamente essa a tarefa que desde o início nos vimos propondo — uma vez que o Mestre, também desde o início, não tem passado de obscuras insinuações com que nos submerge a inteligência menor...

 

E contudo... talvez esse tolher das "inteligências menores" seja exactamente o ponto de apoio que nos faltava, pois é a subjugação daqueles espíritos mais opinativos, desorientados desde o primeiro instante no labirinto das interpretações, que favorece a emergência das principais facetas do texto, que várias vezes já apontámos — a emotividade e o apelo a motivos.

 

Ora, para pouparmos ao leitor mais uma daquelas digressões entediantes a que se tem vindo a habituar, iremos nós, eternos voluntaristas, directamente ao assunto:

 

— Como deixámos claro logo à partida, este manifesto ideológico (basta ler-lhe o título) visa a) empolgar o leitor, para simultaneamente, o incentivar à b) ousadia combativa ao mesmo tempo ainda que lhe aponta um c) antagonista "à medida" (não nos esqueçamos que, até agora, ele foi simplesmente sugerido, e não nomeado).

 

(Se permanece pouco claro o exposto acima, talvez valha a pena dar uma vista de olhos aqui.)

 

— Pois é nesta subtilíssima e pluriforme encenação (não nos esqueçamos que nem passámos ainda da primeira página do opúsculo!) que sobressai a Psicológica Genialidade Diversiva do Mestre:

 

1) O Irascível Mundano, fogoso e impulsivo,
já corre descendo até ao botequim mais vizinho com a
matraca escondida no bolso, pronto a lançar-se sobre o
primeiro censor que lhe apontem à frente...

 

2) O Irascível Mental, igualmente fogoso mas especialmente 
precavido naquilo que toca ao desperdício de calorias, já corre descendo
também até ao botequim mais vizinho, pronto a apontar o primeiro
censor que se lhe levante à frente...

 

3) O Contemplativo Passivo, cogitabundo e idólatra,
encerra-se imediatamente no seu cubículo das águas-furtadas
sorvendo amorosamente cada ponto de exclamação do Mestre e redigindo
com diligência uma breve epístola para a "Coluna do Leitor" do seu semanário de
eleição, em que tece os maiores encómios à indómita clarividência do Mestre
("Mestre" é um daqueles epítetos que os Contemplativos Passivos mais
rebeldes gostam de empregar com insistência.)

 

4) O Contemplativo Obtuso, cogitabundo e ressentido,
encerra-se imediatamente no seu cubículo das águas-furtadas sorvendo
acrimoniosamente cada parêntesis do Mestre e reescrevendo com zeloso afã
trezentas breves epístolas para a "Coluna do Leitor" de um semanário que um dia
há-de publicar, em que corrói até ao mais ínfimo paralogismo cada sofisma do Mestre
("Mestre" é um daqueles epítetos que os Contemplativos Obtusos mais
irónicos gostam de empregar com insistência.)

 

... é que para além de estar preparado o palco para mais um sublime pronunciamento de sangue, procede a uma meticulosa selecção natural (veja-se o paralelismo com a dita maioridade natural) dos actores do processo, de acordo com os respectivos méritos:

 

alfa) vão sangrar os dispostos a sangrar

 

beta) vão vociferar os dispostos a vociferar

 

Os analfabetos nem se apercebem do que se está a passar

 

e...

 

gama) vai ganhar quem tem a gamar

 

Eis aqui, portanto, o processo revolucionário em epítome — e sob a óptica da luminosa justiça retributiva do ACUSADOR DO HOMEM. Ou seja, segundo os incontornáveis princípios do Darwinismo Social, que é, no fundo, a conclusão lógica daquele bastante mais poético Darwinismo Transformista que hoje já não incomoda ninguém.

 

E antes que nos comecem a lançar pedras como à mulher adúltera, deixai-nos notar que o Darwinismo que referimos é o do vovô Erasmus, coetâneo do nosso Mestre, e não o do seu célebre netinho Charles... este, vamos reservar para depois.

 

 

Antes de concluir, apercebemo-nos que deixámos apenas um pormenor por esclarecer ! Precipitação nossa, porque estávamos prestes a dar como óbvia a parte final do sexto extracto do texto em análise...

 

6. "É tão cómodo ser menor. Se eu tiver um livro que tem entendimento por mim, um director espiritual que em vez de mim tem consciência moral, um médico que por mim decide da dieta, etc., então não preciso de eu próprio me esforçar. Não me é forçoso pensar, quando posso simplesmente pagar; outros empreenderão por mim essa tarefa aborrecida."

 

Esquecemo-nos de sublinhar que, de entre todas as interpretações possíveis, não há a menor razão para excluir as prosaicas... (Preferimos não usar o fantasioso termo "literal".)

 

... Pois o Iluminado, muito superior a toda esta retórica, sabe melhor que ninguém que não é no palco que distribuem os dividendos — e que aqueles que conhecem de onde extrair o maná não gostan de perder o seu precioso tempo com... "tarefas aborrecidas".

 

Ora...

 

"Après moi, le déluge..."

 

•••

 

Correcção do TPC

 

TPC-Resposta.jpg

Se alinhavastes a coisa mais ou menos assim, tendes 18 valores...
Porque, como se dizia no tempo da Velha Senhora, "19 são para mim que vos ensino,
e 20 para Deus, que nos deve ensinar a todos."

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 14:58

31. O que é o Iluminismo ? (6)

por PM, em 16.09.16

Em que a Iluminação
começa a dar luz

 

Depois de apontarmos a intimidação, a dissimulação e o discurso oblíquo como principais elementos estruturantes da "Resposta à Questão: — O que é o Iluminismo ?" e o anticlericalismo como seu objectivo fundamental, podemos finalmente explorar o texto kantiano na sua autenticidade — a de manifesto ideológico.

 

E se nos dermos ao trabalho de folhear um qualquer manual de história, teremos oportunidade de perceber porquê: afinal, o que se estava a engendrar na Prússia de finais do século XVIII era a recauchutagem do Reich que iria dedicar os séculos seguintes a exibir-nos a sua acutilante modernidade — e vale a pena ponderar sobre a questão, pois é através dela que mais rapidamente podemos chegar à intelecção de como tudo aquilo que se designa como "progresso moderno" não passa de um viscoso eufemismo para o mais genuíno retrocesso civilizacional.

 

Nesse momento histórico, porém, aquilo que mais faltava aos "Fredericanos" candidatos a Führer era todo um sistema sócio-político que desse algum lustro às suas novas vestes... despóticas... que os "esclarecesse", portanto... E era precisamente nesse particular que os "Iluminados" já tão boas provas vinham dando desde... "fazia algum tempo"...

 

Munidos agora destas banalidades de "história de algibeira", a justa interpretação da "Resposta à Questão: — O que é o Iluminismo ?" torna-se bastante mais cómoda... e aquela quase invisível nota de rodapé logo na primeira página adquire assim a sua autêntica proporção:

 

 " * A indicação da página da Berlinische Monatsschrift refere-se
à seguinte nota na frase: “Será aconselhável ratificar posteriormente o
vínculo conjugal por meio da religião?” do Sr. Preg. Zöllner: “Que é o Iluminismo?”
Esta pergunta, quase tão importante como esta “Que é a Verdade?”,
deveria receber uma resposta antes de se começar a esclarecer!
E, no entanto, em nenhum lugar a vi ainda respondida. "

 

Confima ao leitor atento que o nosso manifesto se enquadra deveras na acesa polémica sobre o lugar da religião (cristã) na sociedade, que entre os finais do século XVIII e os meados do século XIX atingiu o paroxismo. Nesta altura do nosso trajecto, a bem de nos atermos ao propósito inicial, não aprofundaremos a questão. Convém apenas reter que a "Revolução" que na Prússia se ia cozinhando em "banho-maria" era exactamente a mesma que em França tinha chegado a um impasse que só as guilhotinas vieram resolver...

 

Mas tergiversamos... regressemos ao nosso texto com brevidade, até porque quando se trata de religião (cristã) há muitos para os quais se torna suave o jugo da bota prussiana e desportivo o rolar das cabeças...

 

 

6. "É tão cómodo ser menor. Se eu tiver um livro que tem entendimento por mim, um director espiritual que em vez de mim tem consciência moral, um médico que por mim decide da dieta, etc., então não preciso de eu próprio me esforçar. Não me é forçoso pensar, quando posso simplesmente pagar; outros empreenderão por mim essa tarefa aborrecida."

 

— ... e infelizmente retomamos o nosso (pre)texto no registo da trivialidade... Arengando as massas como agente de recrutamento do Império em esboço, Kant transita agora para os juízos de valor... Afinal, perante o heroismo dos recrutas cerrando fileiras sob o fogo inimigo, que figura pode fazer o humilde devoto ajoelhado ao altar ?

 

— Que pode valer o apaziguamento de uma oração em comunidade ao domingo, quando lá fora se faz ouvir o tropel das Valquírias ?

 

— Adiante... O que representa então nestas alusões veladas o fogoso anticlerical ?

 

"um livro que tem entendimento por mim" — a Bíblia, só pode...

 

"um director espiritual que em vez de mim tem consciência moral" — esta é óbvia...
o confessor, em primeiro lugar...

 

"um médico que por mim decide da dieta" — um pouco mais subtil...
são os jejuns e as penitências que ordena a Igreja...

 

— ... mas o que nelas verá simultaneamente o voluntarista filósofo ?

 

"um livro que tem entendimento por mim" — qualquer manual de doutrina,
só pode !

 

"um director espiritual que em vez de mim tem consciência moral" — esta é óbvia...
são as restrições morais que ordena a Religião e a Tradição !

 

"um médico que por mim decide da dieta" — um pouco mais subtil...
o Mestre e a sua Autoridade !

 

— E depois ? Como exercício académico sugerimos que o entusiasta leitor lhes procure descortinar demais leituras possíveis... Porque é essa a plasticidade do véu: debaixo está aquilo que cada um quer ver, aquilo que cada um lá projecta...

 

— Portanto, olhemos para cima do véu — o que distinguiremos aí ???

 

•••

 

Trabalho para casa...

 

a-verdade.jpg

 "Sobre a nudez forte da verdade
o manto diaphano da phantasia."
Eça de Queiroz

(escultura A Verdade, de Teixeira Lopes)

 

... ou quando se começam a tornar letais os anos "letivos"...
(isto é todo um painel de alusões veladas)

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 11:48

30. O que é o Iluminismo ? (5)

por PM, em 10.09.16

 Regresso ao Futuro

 

Além de nos servir para recordar aos fogosos "progressistas" o carácter multimodal e multiforme dos discursos, o aperitivo desta meia-duzia de linhas da "Resposta à questão: — O que é o Iluminismo ?" ajudou-nos a mostrar como é rotineiro que as interpretações autocomplacentes conduzam os comentadores mais sanguíneos a opinações que não passam exactamente... disso mesmo...

 

De resto, para que fique um breve registo das nossas conclusões até ao momento, aqui lavramos a nossa sentença: a "Resposta à questão: — O que é o Iluminismo ?" não é um texto argumentativo. Logo, a despeito de tudo aquilo que os Iluminados pretendam fazer crer aos leigos infantes, não é, estritamente falando, um texto filosófico. Revela-se, isso sim, desde o início, um manifesto eivado de preconceitos, efeitos retóricos e apelos a motivos. Em suma, é um manifesto ideológico e, por isso mesmo, sem sombra de dúvida, um texto revolucionário.

 

Como peça de retórica, recorre a um estilo que vai beber aos modismos provincianos (e convém saber que moda moderno provêm exactamente da mesma raiz) daquela excêntrica Prússia que viu nascer o autor — o recurso a trejeitos do legalismo então germinal, a exaltação das virtudes castrenses tão em voga numa sociedade em via de militarização acelerada, a cega paixão pela frígida "Ratio"... e podíamos continuar nesta linha apontando também a tão Voltairiana e pedante sobranceria de erudito, além de outros "tiques" que algures talvez valha a pena mencionar.

 

Enquanto manifesto ideológico é um texto de tal forma macaco do ponto de vista argumentativo que depois de identificado o elementar apelo a motivos nem se justifica perder mais um segundo a catar-lhe outros paralogismos...

 

... assim, depois de lhe desencantarmos dois ou três tópicos da agenda discreta, já nos preparávamos para nos lançarmos na arrasadora carga final...

 

... sobre um espantalho...

 

 

Pausa — porque incorremos no erro que tanto gostamos de apontar aos outros, porque, sem rodeios, também nós estávamos a contemplar o adversário com o olhar autocomplacente do filósofo encartado que é a marca dos tempos...

 

Contudo, se procurarmos ver a "Resposta à questão: — O que é o Iluminismo ?" no seu contexto, torna-se evidente que a) é um texto que não se dirige a filósofos. Aliás, no momento histórico em que foi publicada, aqueles que poderíamos considerar "filósofos" não passariam de meia-dúzia de mosquitos, ainda rodopiando encandeados em volta da Crítica da Razão Pura do Mestre...

 

Por outro lado, é igualmente óbvio que b) é um texto que não se dirige a ignorantes. Ou seja, o interlocutor de Kant, embora menor, não é o analfabeto nem o iletrado...

 

E assim nos deparamos com esse singular personagem que é o voraz leitor de jornais !

 

Então, talvez agora tudo se torne mais simples... Afinal, o azedume que segrega o nosso revolucionário idealista tem um alvo extremamente fácil de identificar — é aquele pequeno burguês com que já tivémos ocasião de nos encontrar faz alguns tempos, lendo em vernáculo o Discurso do Método... Ora, este recém-letrado pela escola paroquial, se por um lado vive sôfrego das delícias mundanas, por outro permanece avesso às promessas de luminoso paraíso terreal devido ao longínquo eco das admoestações do cura lá da aldeia...

 

E assim chegámos ao ponto de partida de todos os outros, mas percebendo (ainda que só pela rama) porquê: a "Resposta à pergunta: — O que é o Iluminismo ?" não passa de um vulgar...

 

... panfleto anticlerical.

 

Porque embora para a maior parte dos leitores de jornais do final do século XVIII a lógica, as regras de inferência válida do discurso argumentativo, a ciência jurídica e as artes bélicas não fossem mais bem conhecidas do que quaisquer outras "ciências ocultas", os princípios centrais da doutrina cristã eram-lhes extremamente familiares...

 

Por isso, logo desde a primeira linha pressentiam muito bem aonde os estavam a querer levar...

 

(Já agora, bem ao contrário do que actualmente acontece com o voraz espectador de telejornais, que além de desconhecer os mais básicos rudimentos de lógica, argumentação, direito, estratégia e o que mais se quiser, faz gala em desprezar sobranceiramente todos os monumentos erigidos pelos seus próprios avós...)

 

Falta apenas registar como o próprio contexto sócio-cultural da longa estiagem do espírito vinha desde há um par de centenas de anos metodicamente preparando o ambiente perfeito para as fulgorantes experiências de pirotecnia de que as linhas do nosso autor são apenas mais uma acendalha...

 

 

Em suma, para qualquer teutónico minimamente letrado e (in)formado, o aguilhão de uma Nova Ordem afastada de todos os desígnios de igreja, ainda que protestante, estava cravado desde a primeira linha:

 

 "lluminismo é a saída do homem da sua menoridade de
que ele próprio é culpado."

 

A imagem salvífica da Luz Redentora (e "Aufklärung" até corresponde melhor a "iluminação" do que a "Iluminismo") evoca sem rodeios aquele pobre homem caído, aquele filhinho de Deus humilde e resignado que expia o ominoso pecado primal de tão esquiva evasão...

 

"A menoridade é a incapacidade de se servir do
entendimento sem a orientação de outrem."

 

Aqui é necessário esclarecer que na sua dilecta Prússia Kant se dirige tanto a católicos como a protestantes, e se os Romanos ruborescem imediatamente quando adivinham a imolação da Autoridade, da Tradição e da Hierarquia que lhes prepara mais este incendiário, já os Transalpinos suspiram de alívio, pois o domínio que exercem é bastante mais frouxo... E não é preciso dedicar outra linha aos demais, àqueles impulsivos que muito avant la lettre já pairavam para além do bem e do mal, para os quais tanto a figura do Padre como a do Pastor apenas ocorrem como a de "aqueloutros" opressores interesseiros...

 

"Tal menoridade é por culpa própria, se a sua causa não
residir na carência de entendimento, mas na falta de decisão e de
coragem em se servir de si mesmo, sem a guia de outrem."

 

O apelo agora torna-se claro, e os campos definem-se com rigor geométrico: — Basta de tibiezas! O cidadão tem de assumir a sua autonomia. A tragédia dos Primeiros Pais não pode servir de desculpa a ninguém, e estender a mão a Pais substitutos não passa de vil cobardia! — a Nova Ordem está aí, e interpela o indivíduo sem restrições : Ergue-te vilão !

 

"A preguiça e a cobardia são as causas de os
homens em tão grande parte, após a natureza os ter há muito
libertado do controlo alheio
(naturaliter maiorennes), continuarem,
todavia, de bom grado menores durante toda a vida; e também de
a outros se tornar tão fácil assumir-se como seus tutores."

 

Com uma economia notável, o autor faz-se afinal entender limpidamente perante o seu público: aquele inominável "outrem" que tanta espécie nos fez exibe-se sem véu para o anticlericalista primário...

 

E assim podemos concluir — finalmente ! — a interpretação do 5.º período da obra:

 

"A perguiça e a cobardia são também as causas de
ser tão fácil aos sacerdotes (os "outros") assumirem o papel
de tutores dos seres humanos."

 

•••

 

Chegados a esta conclusão tão óbvia, restará perguntar-nos porque nos deixámos enredar de tal forma na análise de uma tão mínimal meia-dúzia de linhas...

 

Para aqueles a quem não é aparente a subtileza: Kant esteve até agora a esgrimir com fantasmas, não nomeando de forma directa adversários, circunstânciasprincípios ou objectivos...

 

O que há são insinuações e suspeições dirigidas — diríamos — "à bon entendeur..."

 

(E para quem nestas linhas tão asperamente censura a cobardia dos menores, é lamentável como simultaneamente nos dá um tão triste exemplo da cobardia dos Mestres...)

 

Pela parte que nos respeita, conhecemos de cor esta estratégia da modernidade — e para lhe dar um nome à altura da época, vamos chamar-lhe discurso oblíquo, no qual, deixando em aberto o flanco da argumentação racional, o autor se faz valer pela (ainda que suposta) audácia... e se à "audácia" chamarmos "topete", imediatamente nos pode assomar à memória alguma coisa...

 

A "abertura de flanco" não é, contudo, uma debilidade — é, precisamente, aquela rarefacção que dá ao discurso a textura tão sugestiva, tão apelativa para a imaginação: no fundo, aquele tom de "canto de sereia" que a todos consegue enredar...

 

E neste seu enredar, já contámos três ou quatro níveis de interpretação. Suspendemos a divagação justamente aí para nos não acontecer também a nós mordermos venenosamente a nossa própria cauda...

 

Quanto aos fogosos, aos sanguíneos, aos impulsivos, aos exaltados da liberdade rebelde — e é a esses que interessa chegar: a legião está já de armas na mão...

 

•••

 

com palavras

 

kant.jpg

 

 (continua)

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 22:34


Arquivo

  1. 2016
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2015
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D


Pesquisar

  Pesquisar no Blog