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"As Cortes e a Constituição não são coisa nova nestes Reinos: são os nossos direitos e os dos nossos Pais." — in Manifesto da Junta Provisional do Governo Supremo do Reino, de 15 de Dezembro de 1820
Para aqueles que crêem que o "nacionalismo" de trazer por casa e o "globalismo" universalizante foram as pragas que mais insidiosamente contaminaram a cultura lusitana nos últimos lustros, reservamos para agora a pior notícia — nenhum dos dois passa de um subproduto barato de outro problema mais comum e viscoso, mas cujo nome foi caindo no olvido desde os tempos da velha senhora... o dos "estrangeirados".
Desde logo, basta a descomplexada recuperação do vernáculo para justificar uma avalanche de impropérios provenientes do mais alargado espectro político-partidário... Anátema! Xenofobia! Racismo! Fascismo! Curiosamente, são proferidos por todos aqueles que fazem questão de sobranceiramente vociferar contra a "degeneração", o "atavismo" e a "inferioridade" dos seus compatriotas. E exige-se aqui um pouco de discernimento, uma vez que para os desatentos é fácil colocar no mesmo saco os "globalistas" e os "estrangeirados" — aliás, estes primam para que o mimetismo seja perfeito. Todavia, enquanto o globalista borboleteia muito à frente na esteira da perfumada utopia de um Shangri-La consagrado à mais caprichosa objectivação subjectiva, o estrangeirado já sabe onde se lhe encontra a semente — e sabe-o porque no seu foro íntimo o estrangeirado tem uma inconfessável pátria secreta: em geral, aquela que lhe vai despejando uns trocados nos bolsos...
Assim, uma vez que a economia local parece ter atingido um estado de anemia de que não há memória, também nunca foi tão fácil cair no hediondo crime de sacrilégio xenófobo, já que os selectos clubes de cujas filologias depende tanta economia doméstica tiveram de se multiplicar para prover a todos os gostos. Em consequência, embora a francofonia tenha perdido aquela firmeza de peito que já fez todo o seu charme, continua in a divisão de elite dos apologistas da aplicação da certificação de Cambridge aos pedigrees das nossas crianças, embora na sua peugada siga o afanoso leque de visionários do mandarim, ele próprio estridentemente perseguido pela turbamulta de cliques que advogam uma generosa distribuição de doses cavalares de espanhol, alemão, sueco, russo ou até do crioulo de Cabo Verde. Ressuscitaram inclusive da noite dos tempos uns adeptos da inevitável implantação do português do Brasil.
Subjugado pela magnificência dos potentados que insuflam toda esta tropa fandanga de barões da retórica e dilacerado pela explosão das respectivas urgências, redescobre-se perplexamente o velho pata-ao-léu como bárbaro invasor deste mesmo chão que o viu nascer, como ancestral tributário já não só dos destronados donos disto tudo, como também dos mais modernos e discretos comissários da coisa alheia...
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Do Allgarve ao Poortugal foi o tempo de um salto — ou de um assalto, se preferirem.
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